terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Rimbaud

White, Edmund. Rimbaud: a vida dupla de um rebelde. Companhia das Letras; São Paulo / SP; 2010; 190 páginas.

Dados da obra:

Ensaio bibliográfico que refaz o trajeto de Arthur Rimbaud, da infância sob a vigília de uma mãe dominadora à descoberta da boemia parisiense, da paixão tórrida pelo também poeta Paul Verlaine, ao tráfico de armas no continente africano.

Breve relato do autor:

Edmund White é um romancista, escritor de contos e crítico literário, nascido em Cincinnati, Ohio, nos Estados Unidos. Sua obra mais conhecida é, provavelmente, A vida privada de um rapaz, o primeiro volume de uma trilogia autobiográfica que tem continuação com Um belo quarto vazio e Sinfonia a despedida.

Passagens:

“Alguma coisa naquele professor sem papas na língua deve ter atraído o jovem Rimbaud – e assim que ouviu falar da biblioteca de Izambard o menino também se sentiu fortemente atraído por ela. Izambard tinha uma grande coleção de todos os livros mais recentes de poesia francesa e de revistas literárias, bem como muito dos clássicos, e estava disposto a emprestar aqueles volumes ao ávido aluno. Numa cidade pequena, e numa época anterior à difusão das bibliotecas públicas, a simples possibilidade de pôr a mão em livros podia ser um problema quase intransponível.”

“Tal como diversos escritores daquela época (incluindo Marx um pouco antes), Rimbaud adquiriu um ‘bilhete de leitor’ no Museu Britânico. Assim como os escritores picaretas retratados no romance New Grub Street (1891), de George Gissing, sobre a empobrecida classe dos escrevinhadores, Rimbaud passava seus dias na biblioteca pública, onde o calor e a luz eram de graça – um pouco como os cafés de Paris, onde se podia ficar sentado sem ser perturbado ao preço de uma xícara de café. Além disso, Rimbaud podia mergulhar nas amplas coleções de livros do Museu Britânico – incluindo livros escritos pelos communards e indisponíveis na França. Tentou consultar livros pornográficos em francês de autoria do marquês de Sade, mas não lhe deram permissão – tais livros só eram acessíveis a uns poucos ‘especialistas’”.

“Rimbaud sempre insistira com Verlaine para que escrevesse em versos de onze sílabas, o que confere ao poema um andamento estranho, trôpego, que um poeta suave (como Verlaine) ou alquímico (como Rimbaud) poderia disfarçar tensionando o pensamento ou a sintaxe. Por estranho que pareça, tanto Rimbaud quanto Verlaine, nessa fase inicial de separação, aceitaram o desafio do verso de onze sílabas, como se permanecessem fiéis um ao outro na própria pulsação da poesia, muito mais profunda do que as imagens ou o tema.”

“Embora tivesse dado as costas de vez à literatura, Rimbaud permanecia obcecado por livros. Tal como os dois comoventes mas absurdos autodidatas do ‘romance tragicômico’ de Flaubert, Buvard e Pécuchet, Rimbaud queria aprender tudo de cada área de conhecimento prático. Fez vir da França livros sobre metalurgia, hidráulica, funcionamento de barcos a vapor, arquitetura naval, mineralogia, como instalar um depósito de madeira, um guia de bolso sobre carpintaria, alvenaria e assim com diante... Ele, que tinha desejado transformar o mundo por meio da alquimia da linguagem, estava agora reduzido a estudar as verdadeiras técnicas práticas. E, no entanto, o objetivo – saber tudo e controlar tudo – permanecia o mesmo.”

“Verlaine, apesar da falta de contato com Rimbaud, permaneceu fiel a seu gênio. Em 1883, publicou três livretos chamados Les poetes maudits sobre Rimbaud, Mallarmé e Tristan Corbière. Todos os três, hoje reconhecidos entre os maiores de seu tempo, eram desconhecidos quando Verlaine decidiu escrever sobre eles. O texto dedicado a Rimbaud era especialmente corajoso, já que deve ter trazido à tona os escândalos do passado: o julgamento, a prisão, suas relações imorais com Rimbaud, o divórcio. Amargurado e furioso com Rimbaud nos anos de 1875 a 1880, Verlaine agora só falava dele com afeto e admiração. No panfleto, Verlaine reproduzia vários poemas de Rimbaud, que muitos do meio literário parisiense estava lendo pela primeira vez. Ficaram estupefactos. Conforme escreveu Edmond Lepelletier, ninguém tinha lembranças muito favoráveis do garoto que tinham conhecido quinze anos antes. Tudo o que recordavam eram seus modos grosseiros e que se tinha em alta conta: “As citações feitas por Verlaine foram como uma revelação”. Sem os esforços de Verlaine, Rimbaud seria apenas uma nota de rodapé na história de um movimento literário esquecido, o Zutismo.”

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