quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

A mulher que matou os peixes

Lispector, Clarice. A mulher que matou os peixes. Editora Sabiá Ltda. Rio de Janeiro / RJ; 1968; 64 páginas.

Dados da obra:

Com muita delicadeza e sensibilidade, Clarice Lispector narra a história em que confessa ter matado, sem querer, os peixinhos de seu filho, e pede perdão por isso. Antes de contar o fato como realmente aconteceu ela fala sobre todos os bichos de estimação que já viveram em sua casa, convidados ou não, além de outros animais de amigos e conhecidos. Por essa história a criança compreende que a mãe também erra, como todos os seres humanos.

Breve relato da autora:

Clarice Lispector, cujo nome de batismo é Haia Pinkhasovna Lispector, nasceu na Ucrânia, mas chegou ao Brasil quando tinha dois meses, por isso é considerada uma escritora e jornalista brasileira. Por iniciativa de seu pai, à exceção de Tania – irmã, todos mudaram de nome em terras brasileiras.

Passagens:

“Vocês ficaram tristes com essa história: Vou fazer um pedido para vocês: todas as vezes que vocês se sentirem solitários, isto é, sozinhos, procurem uma pessoa para conversar. Escolham uma pessoa grande que seja muito boa para crianças e que entenda que às vezes um menino ou uma menina estão sofrendo. Ás vezes de pura saudade, como os periquitos australianos. Conheço uma moça que toca piano muito bem nos teatros. Essa moça ganhou de presente no dia do seu aniversário um periquito australiano. Só ganhou a fêmea. O pior é que as pessoas que dão um periquito australiano têm que comprar dois: um macho e uma fêmea que, por causa da raça deles, são tão amorosos que passam o dia se beijando e não podem ser separados. A periquita até adoeceu de tanta saudade do macho dela.”

“Eu fico muito ofendida quando um bicho tem medo de mi, pois sou corajosa e protejo os animais. Quem de vocês tiver medo, eu cuido e consolo. Porque sei o que é o medo que as crianças têm porque já fui criança. Até hoje ainda tenho medo de certas coisas.”

“Devem ter passado fome, igual a gente. Mas nós falamos e reclamamos, o cachorro late, o gato mia, todos os animais falam por sons. Mas o peixe é tão mudo como uma árvore e não tinha voz para reclamar e me chamar. E quando fui ver, estavam parados, magros, vermelhinhos – e infelizmente já mortos de fome.”

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Rimbaud

White, Edmund. Rimbaud: a vida dupla de um rebelde. Companhia das Letras; São Paulo / SP; 2010; 190 páginas.

Dados da obra:

Ensaio bibliográfico que refaz o trajeto de Arthur Rimbaud, da infância sob a vigília de uma mãe dominadora à descoberta da boemia parisiense, da paixão tórrida pelo também poeta Paul Verlaine, ao tráfico de armas no continente africano.

Breve relato do autor:

Edmund White é um romancista, escritor de contos e crítico literário, nascido em Cincinnati, Ohio, nos Estados Unidos. Sua obra mais conhecida é, provavelmente, A vida privada de um rapaz, o primeiro volume de uma trilogia autobiográfica que tem continuação com Um belo quarto vazio e Sinfonia a despedida.

Passagens:

“Alguma coisa naquele professor sem papas na língua deve ter atraído o jovem Rimbaud – e assim que ouviu falar da biblioteca de Izambard o menino também se sentiu fortemente atraído por ela. Izambard tinha uma grande coleção de todos os livros mais recentes de poesia francesa e de revistas literárias, bem como muito dos clássicos, e estava disposto a emprestar aqueles volumes ao ávido aluno. Numa cidade pequena, e numa época anterior à difusão das bibliotecas públicas, a simples possibilidade de pôr a mão em livros podia ser um problema quase intransponível.”

“Tal como diversos escritores daquela época (incluindo Marx um pouco antes), Rimbaud adquiriu um ‘bilhete de leitor’ no Museu Britânico. Assim como os escritores picaretas retratados no romance New Grub Street (1891), de George Gissing, sobre a empobrecida classe dos escrevinhadores, Rimbaud passava seus dias na biblioteca pública, onde o calor e a luz eram de graça – um pouco como os cafés de Paris, onde se podia ficar sentado sem ser perturbado ao preço de uma xícara de café. Além disso, Rimbaud podia mergulhar nas amplas coleções de livros do Museu Britânico – incluindo livros escritos pelos communards e indisponíveis na França. Tentou consultar livros pornográficos em francês de autoria do marquês de Sade, mas não lhe deram permissão – tais livros só eram acessíveis a uns poucos ‘especialistas’”.

“Rimbaud sempre insistira com Verlaine para que escrevesse em versos de onze sílabas, o que confere ao poema um andamento estranho, trôpego, que um poeta suave (como Verlaine) ou alquímico (como Rimbaud) poderia disfarçar tensionando o pensamento ou a sintaxe. Por estranho que pareça, tanto Rimbaud quanto Verlaine, nessa fase inicial de separação, aceitaram o desafio do verso de onze sílabas, como se permanecessem fiéis um ao outro na própria pulsação da poesia, muito mais profunda do que as imagens ou o tema.”

“Embora tivesse dado as costas de vez à literatura, Rimbaud permanecia obcecado por livros. Tal como os dois comoventes mas absurdos autodidatas do ‘romance tragicômico’ de Flaubert, Buvard e Pécuchet, Rimbaud queria aprender tudo de cada área de conhecimento prático. Fez vir da França livros sobre metalurgia, hidráulica, funcionamento de barcos a vapor, arquitetura naval, mineralogia, como instalar um depósito de madeira, um guia de bolso sobre carpintaria, alvenaria e assim com diante... Ele, que tinha desejado transformar o mundo por meio da alquimia da linguagem, estava agora reduzido a estudar as verdadeiras técnicas práticas. E, no entanto, o objetivo – saber tudo e controlar tudo – permanecia o mesmo.”

“Verlaine, apesar da falta de contato com Rimbaud, permaneceu fiel a seu gênio. Em 1883, publicou três livretos chamados Les poetes maudits sobre Rimbaud, Mallarmé e Tristan Corbière. Todos os três, hoje reconhecidos entre os maiores de seu tempo, eram desconhecidos quando Verlaine decidiu escrever sobre eles. O texto dedicado a Rimbaud era especialmente corajoso, já que deve ter trazido à tona os escândalos do passado: o julgamento, a prisão, suas relações imorais com Rimbaud, o divórcio. Amargurado e furioso com Rimbaud nos anos de 1875 a 1880, Verlaine agora só falava dele com afeto e admiração. No panfleto, Verlaine reproduzia vários poemas de Rimbaud, que muitos do meio literário parisiense estava lendo pela primeira vez. Ficaram estupefactos. Conforme escreveu Edmond Lepelletier, ninguém tinha lembranças muito favoráveis do garoto que tinham conhecido quinze anos antes. Tudo o que recordavam eram seus modos grosseiros e que se tinha em alta conta: “As citações feitas por Verlaine foram como uma revelação”. Sem os esforços de Verlaine, Rimbaud seria apenas uma nota de rodapé na história de um movimento literário esquecido, o Zutismo.”

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A Ilha de Nim

Orr,Wendy. A Ilha de Nim. Brinque-Book; São Paulo / SP; 2008; 72 páginas.

Dados da obra:

Nim é uma menina que vive feliz em uma ilha no meio do grande mar azul, com seu pai Jack, um iguana-marinho chamado Fred, uma leoa-marinha conhecida como Selkie, uma tartaruga de nome Chica e uma antena parabólica para seu e-mail. Um belo dia Jack viaja e desaparece com seu barco a vela, obrigando Nim a ser mais valente do que nunca e contar ainda mais com a ajuda de seus velhos e novos amigos.

Breve relato da autora:

Wendy Orr é uma autora de origem canadense, com vários títulos infantis e juvenis publicados. Cresceu com vários animais de estimação, em diferentes lugares da América do Norte e da França.
O livro conta com ilustrações de Kerry Millard, canadense, que cresceu cercada de todo tipo de animais. Tornou-se veterinária e mais tarde começou nova carreira como ilustradora, cartunista e autora premiada.

Passagens:

“O que Nim mais gostava ao fazer pão era de observar a massa que havia feito com farinha seca de trigo, fermento e água transformar-se em pão quentinho. ‘Ciência’, Jack dizia, mas Nim achava que era magia.
Nesse dia não era nada.
Nesse dia, quando o pão borbulhou e inchou no meio, ela nem sorriu. Quando o pegou rapidinho com seu espeto de bambu e o arrumou de volta na folha de bananeira, era apenas pão, porque fazer pão era o que Nim tinha que fazer nesse dia. E se ela fizesse tudo o que tinha para fazer, Jack voltaria para casa à noite e tudo ficaria bem.”

“De repente, ela estava cansada demais para qualquer outra coisa. Fez um sanduíche de banana e se aninhou na rocha entre Selkie e Fred para ler o último capítulo do livro.
Quando terminou ficou feliz e triste ao mesmo tempo, porque o final a fez sentir-se aquecida e sorridente, mas ela não queria dizer adeus às pessoas do livro.
– Vou ler outra vez! – decidiu, e leu o título em voz alta, como se nunca o tivesse visto antes: A Loucura da Montanha, por Alex Rover.”

“Quando a manhã esquentou, eles ficaram descansando nos bancos rasos de areia da Praia da Tartaruga. Chica estava cansada porque tinha nadado centenas de quilômetros e botado noventa e nove ovos. Nim estava cansada porque tinha ficado acordada até tarde vendo Chica botar os ovos. Selkie estava cansada porque tinha ficado preocupada por Nim ter ido dormir tão tarde. Fred não estava cansado, mas ele não se importava de ficar com preguiça se todos estavam.“

“O caniço era de bambu, forte e elástico. Fora feito por Jack para o aniversário de Nim, e ele é que a tinha ensinado a jogar a linha em um arco que assobiava – a melhor parte de uma pescaria, Nim achava.
Era por isso que ela detestava pegar um peixe logo de cara: era como terminar um jogo de bola depois da primeira jogada. Sete tentativas desta vez, e então um peixe prateado dançou na ponta da sua linha. Era bom de comer, do tamanho certo... – Lamento, Peixe – disse Nim, e rapidamente o matou. Essa era a parte de que não gostava.”

“Alex olhou pela janela. Do quadragésimo quarto andar, podia ver a uma longa distância, porém, por mais que se esforçasse, não conseguia ver a Enseada do Buraco da Fechadura ou um Herói em uma jangada de coco.
E só por um momento, Alex desejou ser uma pessoa que fazia coisas em vez de escrever sobre elas... Que pudesse velejar pelos mares ou viver alegremente em uma ilha tropical.
Mas Alexandra Rover era uma sonhadora, não uma ‘fazedora’. Estava presa a um lugar como um trem em um trilho, fazia parte da cidade como o relógio da estação.”