Breve relato do autor:
Ian
McEwan é um escritor britânico, chamado por vezes de “Ian Macabro”, devido à
natureza das suas primeiras obras, e que de romance a romance se tem convertido
em um dos mais conhecidos da sua geração.
Dados da obra:
Na tarde
mais quente do verão de 1935, na Inglaterra, a adolescente Briony Tallis vê uma
cena que vai atormentar a sua imaginação: sua irmã mais velha, sob o olhar de
um amigo de infância, tira a roupa e mergulha, apenas de calcinha e sutiã, na
fonte do quintal da casa de campo. A partir desse episódio e de uma sucessão de
equívocos, a menina, que nutre a ambição de ser escritora, constrói uma
história fantasiosa sobre uma cena que presencia. Comete um crime com efeitos
devastadores na vida de toda a família e passa o resto de sua existência
tentando desfazer o mal que causou.
Passagens:
Uma
história era algo direto e simples, que não permitia que nada se intrometesse
entre ela e seu leitor – nenhum intermediário incompetente e cheio de ambições
próprias, nenhuma pressão do tempo, nenhuma limitação de recursos. Na história
era só querer, era só escrever e ter um mundo inteiro, numa peça era necessário
utilizar o que estava disponível: não havia cavalos, não havia ruas, não havia
mar. Não havia cortina...”.
Não eram
só o mal e as tramoias que tornavam as pessoas infelizes; era a confusão, eram
os mal-entendidos; acima de tudo, era a incapacidade de apreender a verdade
simples de que as outras pessoas são tão reais quanto nós. E somente numa
história seria possível incluir essas três mentes diferentes e mostrar como
elas tinham o mesmo valor. Essa era a única moral que uma história precisava
ter.
A
excitação que ele sentia assemelhava-se a dor e era exacerbada pela pressão das
contradições: Cecília era familiar como uma irmã, exótica como uma amante; ele
sempre a conhecera, ele não sabia nada sobre ela; ela era feia, ela era bela;
era forte – com que facilidade se defendera do irmão – e, vinte minutos antes,
havia chorado; a carta idiota de Robbie a repugnara, porém tivera o efeito de
libertá-la. Ele lamentava seu erro, ele exultava por tê-lo cometido...
Os gêmeos
não corriam perigo; Cecília estava com Leon, e ela, Briony, tinha liberdade de
andar pelo parque escuro e pensar sobre o dia extraordinário que tivera. Sua
infância chegara ao fim – decidiu enquanto voltava da piscina, no momento em
que rasgou o cartaz. Havia deixado para trás os contos de fadas, e no intervalo
de umas poucas horas havia testemunhado mistérios, lido uma palavra indizível,
interrompido uma brutalidade e, tornando-se alvo do ódio de um homem em quem
todos até então confiavam, passara a participar do drama da vida adulta...
Estavam
se aproximando das últimas casas da vila. Num campo mais adiante, Turner viu um
homem e seu collie caminhando atrás de um arado puxado por um cavalo. Tal como
as mulheres na sapataria, o fazendeiro parecia não se dar conta da presença da
coluna. Essas vidas eram vividas em paralelo – a guerra era um hobby para
entusiastas, e nem por isso deixava de ser uma coisa séria. Tal como, no
momento mais intenso de uma caçada, quando os cães se preparavam para lançar-se
sobre a presa, do outro lado da sebe passa um automóvel no qual, no banco de
trás, uma mulher faz tricô, e no jardim de uma casa nova um homem ensina o filho
a chutar a bola. O fazendeiro continuaria a arar o campo, depois haveria alguém
para fazer a colheita, alguém para processar o trigo no moinho, outras pessoas
comeriam o pão, e nem todo mundo estaria morto...
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