Kafka, Franz. O Castelo. Livros do Brasil. Castelo Branco / Portugal; 1946; 406 páginas.
Breve
relato do autor:
Franz Kafka foi um dos maiores escritores de ficção
do século XX. De origem judaica, ele nasceu em Praga, Áustria-Hungria (atual
República Checa), e escrevia em língua alemã. O conjunto de seus textos— na
maioria incompletos e publicados postumamente — situa-se entre os mais
influentes da literatura ocidental.
Dados da obra:
Escrito durante cerca de seis meses em 1922, O Castelo foi lançado somente depois da morte de Kafka. O livro consiste na história de um agrimensor chamado K. que é chamado por um conde de um local não especificado para prestar seus serviços. Contudo, por mais que tente, não consegue entrar no castelo, ficando na vila de fora do castelo ao longo da narração. Os monólogos do livro são vários (o livro possui mais de 400 páginas) e as personagens muitas vezes desmentem-se ou mostram variadas interpretações de um mesmo fato, o que provoca um clima de confusão ou simples falta de informação. As interpretações do livro são muitas, desde simplesmente uma crítica à burocracia estatal até uma visão religiosa, mais especificamente judaica. Há também uma visão psicológica dizendo que o castelo seria o inconsciente de K. e a vila sua consciência.
Passagens:
... E agora o
senhor: quem é o senhor, junto de quem tão humildemente lutamos por conseguir a
anuência a um pedido de casamento? O senhor não é do Castelo, o senhor não é da
aldeia, o senhor não é nada! Mas, infelizmente, o senhor é alguma coisa: um
estrangeiro; alguém que está a mais; um empecilho a estorvar todos os caminhos:
alguém que está sempre a causar-me maçadas e nos obriga a desalojar as
crianças; alguém que veio seduzir a nossa pequena Frieda muito amada e a quem
agora, infelizmente, nós a temos de dar em casamento.
– Minha senhora –
disse K. –, não entendo porque é que a senhor se humilha, e só por uma coisa
destas, ao ponto de me dirigir rogos. Se, como diz, é de todo em todo
impossível eu falar com Klamm, então não o conseguirei mesmo, quer me dirijam
rogos quer não. Mas dado o caso de ser possível eu falar com ele: porque o não
hei-de fazer? Tanto mais que, firmada nesse caso a sua principal objeção, todos
os seus outros receios se tornam duvidosos. Concedo que sou ignorante, é uma
verdade que, em todo o caso, permanece válida, o que já jê bem triste para mim;
mas também tem uma vantagem: quem ignora ousa mais – e por isso estou disposto
a suportar de bom grado por mais algum tempo, até onde as forças me chegarem, o
fardo da minha ignorância com todo o rol das suas consequências, bem más por
certo.
Ainda não teria dado
dois passos na estrada quando viu duas luzinhas vacilarem ao longe; trouxe-lhe
alegria aquele sinal de vida, e ele foi ao encontro delas, assim como elas, por
sua vez, vinham flutuando ao encontro dele. Não soube explicar o seu
desapontamento ao reconhecer os ajudantes. Pois não vinham eles ao seu
encontro, enviados provavelmente, por Frieda? E não eram dele aquelas lanternas
que o vinham salvar da escuridão agressivamente ululante à sua volta? Apesar disso,
ficara decepcionado: esperara estranhos, sim, não aqueles seus velhos
conhecidos que lhe eram um fardo. Mas não eram só os ajudantes: de entre eles,
da escuridão, surgiu Barnabás.
... o fato de ela
ter perguntado por K. não significava que fosse uma exceção à regra: pelo
contrário, justamente ao mencioná-lo, tivera ela oportunidade de exprimir o
desejo de o ver; não o fizera, porém, e dera assim a entender claramente a sua
vontade. Ela queria apenas ouvir falar dele, não falar com ele.
... Barnabás é
recebido normalmente numa grande sala de chancelaria; mas não é a chancelaria
de Klamm, nem é sequer a chancelaria de um só funcionário. Acha-se dividida em
duas partes, a todo o comprimento, por uma estante de uma só peça, que vai de
parede a parede: numa parte estreita em que duas pessoas mal podem passar uma
pela outra, é o espaço reservado aos funcionários, e numa outra larga, é o
espaço destinado às partes em litígio, aos espectadores, aos criados, aos
mensageiros. Sobre essa estante há grandes livros aberto, um a seguir ao outro,
e diante da maior parte deles estão postados funcionários e leem. Mas não ficam
sempre diante do mesmo livro, mudam, porém, não os livros mas os lugares, e é
esta mudança de lugares o que mais espanta Barnabás, eles apertam-se então
muito ao passarem uns pelos outros, justamente por causa da estreiteza do
espaço. À frente, rente à estante, há mesinhas baixas, sentados a elas estão
escrivães que escrevem o que os funcionários lhes ditam quando estes assim o
desejam.
... Sem dúvida, este
estar parado inutilmente, este esperar inutilmente, dia após dia, e o eterno
recomeçar, sem nunca ver esboçar-se uma mudança, isto arrasa os nervos, torna
as pessoas céticas e incapazes, por fim.
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