Goethe, J. Wolfgang.
Os sofrimentos do jovem Werther. Nova
Alexandria, São Paulo / SP, 1999; 144 páginas.
Breve relato do autor:
J. W. Goethe foi um
escritor alemão e pensador que também fez incursões pelo campo da ciência. Como
escritor, foi uma das mais importantes figuras da literatura alemã e do
Romantismo europeu, nos finais do século XVIII e inícios do século XIX.
Dados da obra:
Os sofrimentos do jovem Werther é um marco do romantismo, considerado por muitos como
uma obra-prima da literatura mundial, é uma das primeiras obras do autor, de
tom autobiográfico - ainda que Goethe tenha cuidado para que nomes e lugares
fossem trocados e, naturalmente, algumas partes fictícias acrescentadas, como o
final.
O jovem Werther é
marcado por uma paixão profunda, tempestuosa e desditosa. Sofre com a
impossibilidade de consumar o amor ao se enamorar por uma jovem, Charlotte, já
prometida a outro homem. A história é contada por meio de cartas enviadas por
Werther ao seu amigo e também por intervenções do narrador.
Passagens:
Bem sei que não
somos iguais, nem o poderíamos ser, mas acho que todo aquele que julga ser
necessário afastar-se do que chamamos de povo para fazer-se respeitar é tão
censurável quanto o covarde que se esconde do inimigo por medo de ser
derrotado.
Farei o possível
para vê-la o quanto antes, ou, pensando bem melhor, devo evitá-la. É preferível
vê-la através dos olhos de seu apaixonado: talvez os meus não a vejam tal como
ela agora se apresenta em minha mente. Por que, então, macular tão bela imagem?
... O autor que
prefiro é aquele no qual se encontra o mundo em que vivo, em cujos livros as
coisas se passam como em volta de mim, e cuja narração me prende e me interessa
tanto quanto minha vida doméstica que, se não é nenhum paraíso, representa para
mim uma fonte de inexprimível felicidade.
Considero-me
imensamente feliz apenas por poder sentir a simples e inocente alegria do homem
que põe em sua mesa um legume que ele próprio cultivou, e que não apenas o
saboreia, mas igualmente, e num só momento, sorve todos esses dias felizes, a
linda manhã em que o plantou, as encantadoras tardes e que o regou e teve o
prazer de vê-lo crescer, dia após dia!
Falam que a pedra de
Bolonha, exposta ao sol absorve os seus raios, e durante a noite se conserva
luminosa durante algum tempo. Tive a impressão de que o mesmo se dava com
aquele rapaz. A ideia de que os olhos de Lotte lhe haviam fitado o rosto, as
faces, os botões de sua roupa, a gola do sobretudo, tornava tudo nele precioso
e sagrado. Nesse momento, eu não cederia meu criado nem por mil táleres. Sua
presença me fazia bem. Pelo amor de Deus, não vá rir de mim! Wilhelm, como pode
ser ilusão aquilo que nos faz tão felizes?
– Chama a isso
fraqueza? Por favor, não se deixe conduzir pelas aparências. Ousaria chamar de
fraco um povo que, sofrendo o jugo irrespirável de um tirano, um dia se revolta
e arrebenta suas cadeias? Devemos chamar de fraco o homem que, ante a horrível
visão do incêndio ameaçando-lhe a casa, sente todas as forças exaltadas e
carrega facilmente os fardos que, a sangue-frio, mal poderia mover? Ou então o
homem que, enfurecido por uma ofensa, confronta seis outros e os vence? Mas,
meu amigo, se o esforço constitui a força, por que motivo o esforço extremo
seria considerado debilidade?
Estou certo de que
somente o amor torna o homem necessário neste mundo.
... Ah! O que sei,
todos podem saber... Mas este coração é somente meu.
Ah! Tão transitório
é o homem que, mesmo nos lugares onde tem absoluta certeza de sua existência,
sua presença deixa gravada uma impressão indelével na lembrança e na alma de
seus amigos, mesmo ali vai se apagar, desaparecer num piscar de olhos.
... Que homem, que
pai poderia encolerizar-se, quando seu filho, chegado de súbito, o abraçasse e
exclamasse: “Estou de volta, meu pai! Não fique zangado se abrevio peregrinação
que, segundo sua vontade, deveria seguir por mais tempo. O mundo é o mesmo em
toda parte, após o cansaço e o trabalho, a recompensa e o prazer. Mas de que me
vale tudo isso? Só me sinto bem perto de você, e quero ser feliz ou infeliz em
sua presença...”
Oh, Pai celeste e
misericordioso, poderia repelir esse filho pródigo?
Por que é que teve
de nascer com essa impetuosidade, com essa paixão indomável que o prende a tudo
que o impressiona? [...] Por favor, modere-se! Seu espírito, seus
conhecimentos, seu talento, quantos prazeres eles lhe oferecem! [...] Não
percebe que está se iludindo, que está se arruinando voluntariamente? Por que
eu, Werther? Justamente eu...
E que importa que
Albert seja seu marido? Seu marido! Isso é bom para o mundo... o mundo, para o
qual é um pecado eu amar você e querer tirar-lhe de seus braços. Pecado? Que
seja! Irei me punir por minhas próprias mãos. Saboreei este pecado em toda a
sua celeste volúpia; o meu coração absorveu-lhe o bálsamo e a força da vida.
Desde esse momento Lotte, você é minha, é minha. Vou primeiro para junto de meu Pai, para
junto de seu Pai. Não deixarei de queixar-me perante Ele, e Nele buscarei
consolo, enquanto espero a sua vinda. E sairei a seu encontro, e a levarei
comigo, e ficarei junto de você, num abraço eterno, diante da face do Deus
infinito.
Quando vejo as
limitações que aprisionam a capacidade humana de ação e pesquisa; quando vejo
que toda a atividade se esgota na necessidade cujo único propósito é prolongar
nossa pobre existência, e ainda que toda a tranquilidade em relação a certas
questões não passa de uma resignação sonhadora, pois as paredes que nos
aprisionam estão cobertas de formas coloridas e perspectivas luminosas...
... Mas, quando já
está prestes a tomar esse rumo, lembra-se da fábula do cavalo que, insatisfeito
com sua liberdade, deixou que lhe colocassem sela e arreios, para que o
cavalgassem e acabassem com ele.