quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Coração de tinta

Funke, Cornelia. Coração de Tinta. Companhia das Letras; São Paulo / SP; 2006; 456 páginas.

Dados da obra:

Literatura infanto-juvenil cuja história gira em torno do encadernador Mo, cuja habilidade é dar vida aos personagens dos livros quando lido em voz alta. Mas, ao fazer isso, acaba colocando sua vida e a vida da esposa e da filha, Meggie, em perigo, por causa do vilão sanguinário, Capricórnio, que sai da obra Coração de Tinta. A intenção do bandido é fazer com que Mo traga do livro um malvado ainda mais terrível que ele.
O livro venceu o prêmio BookSense Book of the Year Children's Literature de 2004. E faz parte de uma trilogia, que segue com Sangue de Tinta e Morte de Tinta.

Breve relato da autora:

Cornelia Funke é uma escritora alemã de literatura infantojuvenil. Sua fama internacional surgiu com a novela de fantasia O Cavaleiro do Dragão, continuando com O Senhor dos Ladrões e depois com a trilogia Mundo de Tinta.

Passagens:

“Como a chuva não a deixava dormir, ela se sentou, esfregou os olhos e pegou o livro. As páginas farfalhavam cheias de promessas quando ela o abriu. Meggie achava que esses primeiros sussurros soavam de maneira diferente em cada livro, conforme ela soubesse ou não o que ele lhe contaria.”

“A luz do quarto de Mo estava acesa. Era comum ele ficar lendo até altas horas da noite. Meggie herdara do pai a paixão pelos livros. Quando ela tinha um sonho ruim e ia se refugiar junto dele, não havia nada melhor para fazê-la adormecer do que a respiração calma de Mo ao seu lado virando as páginas de um livro. Nada espantava mais rápido os sonhos ruins do que o barulho das folhas impressas.”

“– Mo, por favor! Venha comigo.
Ele não estava acreditando, mas foi atrás dela. Meggie o puxava com tanta impaciência que ele deu uma topada com o dedão do pé numa pilha de livros. E no que mais poderia ser? Havia livros espalhados por toda a casa. Eles não ficavam apenas nas estantes, como na casa das outras pessoas. Não, ali eles se empilhavam de baixo das mesas, em cima das cadeiras, nos cantos dos quartos. Havia livros na cozinha e no banheiro, em cima da televisão e dentro do guarda-roupa, pilhas pequenas, pilhas altas, livros grossos e finos, velhos e novos... livros. Eles acolhiam Meggie de páginas abertas, na mesa do café da manhã, espantavam o tédio nos dias cinzentas – e de vez em quando alguém tropeçava neles.”

“Na porta da oficina de Mo havia uma placa uma pequena placa de latão. Meggie sabia d cor as palavras que estavam escritas ali. Aos cinco anos ela aprendera a ler com aquelas letras antigas e enfeitadas:
Alguns livros devem ser degustados,
Outros são devorados,
Apenas poucos são mastigados
E digeridos totalmente.”

“– Mas como fazem essas crianças sem livros de histórias? – perguntou Naftali.
E Reb Zebulun respondeu:
– Elas têm que se conformar. Livros de histórias não são como pão. Pode-se viver sem eles.
– Eu não poderia viver sem eles – disse Naftali”
(Isaac B. Singer – Naftali, o contador de histórias, e seu cavalo Sun)

“... É bom ter os próprios livros quando se está num lugar estranho, Mo dizia. Ele mesmo sempre levava pelo menos uma dúzia.
... Quando você leva um livro numa viagem, dissera Mo quando ela pôs o primeiro no baú, acontece uma coisa estranha: o livro começa a colecionar lembranças. Depois basta abri-lo, e você já está de novo no lugar onde leu. Tudo volta, já nas primeiras palavras: as imagens, os cheiros, o sorvete que você tomou enquanto lia... Acredite, os livros são como papel pega-moscas. Não existe nada melhor para guardar lembranças do que páginas impressas.”

“Meggie sentou-se no banco atrás da casa, ao lado do qual ainda estavam fincadas as tochas queimadas de Dedo Empoeirado. Ela nunca hesitara tanto antes de abrir um livro. Tinha medo do que a esperava dentro dele. Era uma sensação totalmente nova. Nunca antes tivera medo do que um livro lhe contaria, ao contrário, na maior parte das vezes estava tão ansiosa por se deixar levar para um mundo desconhecido e inexplorado que começava a ler nas ocasiões mais inadequadas. Muitas vezes, no café da manhã, ela e Mo ficavam lendo, os dois, e várias vezes aconteceu de ela chegar atrasada à escola. Ela também lia com o livro debaixo da carteira da escola, no ponto do ônibus, em visitas a parentes, tarde d noite debaixo do cobertor, até que Mo tirava o livro dela e a ameaçava recolher todos os outros que tinha em seu quarto para que ela finalmente pudesse dormir o suficiente. Naturalmente ele nunca faria isso, e sabia que ela sabia que não, mas depois dessas advertências, ela punha o livro debaixo do travesseiro, lá pelas nove horas, e o deixava continuar a fluir em seus sonhos, para que Mo não deixasse de ter a sensação de ser realmente um bom pai.”

“– Por todas as letras do alfabeto! – sussurrou Fenoglio quando andava junto com Meggie pela nave central da igreja, com Basta em seus calcanhares. – Ele é exatamente como eu o imaginei. ‘Pálido como um copo de leite’, sim, acho que foram essas as palavras que usei.
Ele começou a andar mais depressa, como se não aguentasse esperar para ver de perto sua criatura...
... Fenoglio não desgrudava os olhos de Capricórnio por um só instante. Ele o observava como um artista que, depois de longos anos, revê um quadro que pintou. E, a julgar pela expressão do seu rosto, estava gostando do que via. Meggie não conseguia ver nenhum vestígio de medo em seus olhos, apenas uma curiosidade quase incrédula e satisfação, satisfação consigo mesmo. Capricórnio não gostou desse olhar, como Meggie também notou. Ele não estava acostumado ser encarado tão destemidamente, como fazia o velho escritor.
– Basta me contou algumas coisas estranhas a seu respeito, senhor...
– Fenoglio.
Meggie observou o rosto de Capricórnio. Ele teria lido alguma vez o nome que ficava na capa de Coração de Tinta, logo embaixo do título?
– Até mesmo a voz dele é como imaginei! Fenoglio sussurrou para Meggie.
Ele parecia encantado como uma criança diante da jaula do leão.”

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