Luca, Erri de. Em nome da mãe. Companhia das Letras;
São Paulo / SP; 2007; 89 páginas.
Breve relato do autor:
Erri de Lucca é um
escritor italiano. Foi dirigente do grupo de extrema esquerda Lotta Continua, caminhoneiro
e pedreiro. Durante a guerra na ex-Iugoslávia, dirigiu comboios humanitários
destinados à população da Bósnia. Publicou seu primeiro livro Non ora, non qui aos 39 anos e colabora
em diversos jornais. É autor de, entre outras obras, Aceto, arcobaleno (Prêmio France Culture, 1994), Três cavalos (Berlendis & Vertecchia
Editores, 2006) e Montedidio (Prêmio
Femina Étranger, 2002).
Dados da obra:
Em Nome da Mãe trata da vida, esse mistério que é a vida, por meio da Maternidade. Com
a palavra Maria – Miriam, na versão hebraica –, a mãe do Menino Jesus – Ieshu
–, que vai contar os nove meses entre a Anunciação, na aldeia de Nazaré, à
Natividade, em Belém. O autor, estudioso dos textos bíblicos, por meio de seu
conhecimento, mas principalmente da sua sensibilidade, se propõe a desvendar
esse mistério, mas sem compromisso com conceitos teológicos e filosóficos.
Passagens:
“Em nome do pai”
inaugura o sinal-da-cruz. Em nome da mãe inaugura-se a vida.
Os homens dão tanta
importância às palavras, para eles são tudo o que conta, que tem valor. Iosef
queria conhecê-las para poder guardá-las, relatá-las. Logo imaginou as
consequências legais. O anuncio quebrara nosso compromisso. Eu estava grávida
de um anjo que chegara, antes do compromisso. Eu estava grávida de um anjo que
chegara, antes do casamento. Por isso ele pedia outras palavras, para citar na
assembleia, em busca de uma defesa perante a aldeia.
Enquanto isso acontecia,
eu olhava para baixo, para a veste, até os pés. Debaixo dela, meu corpo fechado
estava calmo como um campo de neve. Enquanto ele falava, eu me tornava mãe.
Para perdurar, os homens precisam de palavras, as do anjo para mim eram vento
sem importância. Ele portava palavras e sementes, para mim bastava uma.
... Tamar infringiu a
lei para poder aplicá-la, porque tinha direito de ser mãe em Israel. Belo nome,
Tamar, palmeira que quer dar frutos.
Senhor, Adonai, a tua
frase dirigida à nossa mãe Eva: “Com dor darás à luz filhos” não me amedronta.
É correta a hora dos empurrões para fora, do esforço. Será preciso bastante
esforço para arrancar o menino de mim. Estamos muito bem, nós dois, num só
corpo. Bendito o esforço que nos impõe.
Ele conhece meus
pensamentos. É um varão e me recrimina. Ocupa todo o meu espaço, não só o do
ventre. Está nos meus pensamentos, na minha respiração, cheira o mundo através
do meu nariz. Está em todas as fibras do meu corpo. Quando sair, vai me
esvaziar, vai me deixar vazia como uma casca de noz. Gostaria que nunca
nascesse. Recebo outro chute, porém mais delicado.
“... Com é, Miriam,
conter um filho, uma trouxinha de filho, dentro do corpo?”
“Perguntas à panela como
se sente? Sou só um receptáculo, gostaria de saber como ele se sente dentro de mim.”
“Um receptáculo? Como
podes falar dessa maneira?”
“Sem conhecer nenhum
homem, que mulher sou eu? Sou seu receptáculo.”
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